30 de dez. de 2008

A egreja do Diabo, de Machado de Assis

I

De uma idéa mirifica

Conta um velho manuscripto benedictino que o Diabo, em certo dia, teve a idéa de fundar uma egreja. Embora os seus lucros fossem continuos e grandes, sentia-se humilhado com o papel avulso que exercia desde seculos, sem organização, sem regras, sem canones, sem ritual, sem nada. Vivia, por assim dizer, dos remanescentes divinos, dos descuidos e obsequios humanos. Nada fixo, nada regular. Por que não teria elle a sua egreja? Uma egreja do Diabo era o meio efficaz de combater as outras religiões e destruil-as de uma vez.

— Vá, pois, uma egreja, concluiu elle. Escriptura contra Escriptura, breviario contra breviario. Terei a minha missa, com pão e vinho á farta, as minhas predicas, bullas, novenas e todo o demais apparelho ecclesiastico. O meu credo será o nucleo universal dos espiritos, a minha egreja uma tenda de Abrahão. E depois, emquanto as outras religiões se combatem e se dividem, a minha egreja será unica; não acharei, deante de mim, nem Mahomet, nem Luthero. Ha muitos modos de affirmar; ha só um de negar tudo.

Dizendo isso, o Diabo sacudiu a cabeça e estendeu os braços, com um gesto magnifico e varonil. Em seguida, lembrou-se de ir ter com Deus para communicar-lhe a idéa e desafial-o; levantou os olhos, accesos de odio, asperos de vingança, e disse comsigo: — Vamos, é tempo. E rapido, batendo as azas, com tal estrondo que abalou todas as provincias do abysmo, arrancou da sombra para o infinito azul.


II

Entre Deus e o Diabo

Deus recolhia um ancião, quando o Diabo chegou ao céo. Os seraphins que engrinaldavam o recém-chegado, detiveram-se logo e o Diabo deixou-se estar á entrada com os olhos no Senhor.
— Que queres tu? perguntou este.
— Não venho pelo vosso servo Fausto, respondeu o Diabo, rindo, mas por todos os Faustos do seculo e dos seculos.
— Explica-te.
— Senhor, a explicação é facil; mas permitti que vos diga: recolhei primeiro esse bom velho; dae-lhe o melhor logar, mandae que as mais afinadas citharas e alaúdes o recebam com os mais divinos córos...
— Sabes o que ele fez? perguntou o Senhor, com os olhos cheios de doçura.
— Não, mas provavelmente é dos ultimos que virão ter comvosco. Não tarda muito que o céo fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto. Vou edificar uma hospedaria barata; em duas palavras, vou fundar uma egreja. Estou cançado da minha desorganização, do meu reinado casual e adventicio. É tempo de obter a victoria final e completa. E então vim dizer-vos isto, com lealdade, para que me não accuseis de dissimulação... Boa idéa, não vos parece?
— Vieste dizel-a, não legitimal-a, advertiu o Senhor.
— Tendes razão, acudiu o Diabo; mas o amor proprio gosta de ouvir o applauso dos mestres. Verdade é que n'este caso seria o applauso de um mestre vencido e uma tal exigencia... Senhor, desço á terra; vou lançar a minha pedra fundamental.
— Vae.
— Quereis que venha annunciar-vos o remate da obra?
— Não é preciso; basta que me digas desde já por que motivo, cançado ha tanto da tua desorganização, só agora pensaste em fundar uma egreja?

O Diabo sorriu com certo ar de escarneo e triumpho. Tinha alguma idéa cruel no espirito, algum reparo picante no alforge da memoria, qualquer cousa que, n'esse breve instante da eternidade, o fazia crer superior ao proprio Deus. Mas recolheu o riso, e disse:
— Só agora conclui uma observação, começada desde alguns seculos, e é que as virtudes, filhas do céo, são em grande numero comparaveis a rainhas, cujo manto de velludo rematasse em franjas de algodão. Ora, eu proponho-me a puxal-as por essa franja, e trazel-as todas para a minha egreja; atraz d'ellas virão as de seda pura...
— Velho rethorico! murmurou o Senhor.
— Olhae bem. Muitos corpos que ajoelham aos vossos pés, nos templos do mundo, trazem as anquinhas da sala e da rua, os rostos tingem-se do mesmo pó, os lenços cheiram aos mesmos cheiros, as pupillas centelham de curiosidade e devoção entre o livro santo e o bigode do peccado. Vêde o ardor — a indifferença ao menos — com que esse cavalheiro põe em lettras publicas os beneficios que liberalmente espalha — ou sejam roupas ou botas, ou moedas, ou quaesquer d'essas materias necessarias á vida... Mas não quero parecer que me detenho em cousas miudas; não fallo, por exemplo, da placidez com que esse juiz de irmandade, nas procissões, carrega piedosamente ao peito o vosso amor e uma commenda... Vou a negócios mais altos...

N'isto os seraphins agitaram as azas pesadas de fastio e somno. Miguel e Gabriel fitaram no Senhor um olhar de supplica. Deus interrompeu o Diabo.
— Tu és vulgar, que é o peior que póde acontecer a um espirito da tua especie, replicou-lhe o Senhor. Tudo o que dizes ou que digas está dicto e redicto pelos moralistas do mundo. É assumpto gasto; e se não tens força, nem originalidade para renovar um assumpto gasto, melhor é que te cales e te retires. Olha; todas as minhas legiões mostram no rosto os signaes vivos do tedio que lhes dás. Esse mesmo ancião parece enjoado; e sabes tu que elle fez?
— Já vos disse que não.
— Depois de uma vida honesta, teve uma morte sublime. Colhido em um naufragio, ia salvar-se numa taboa; mas viu um casal de noivos, na flôr da vida, que se debatiam já com a morte; deu-lhe a taboa de salvação e mergulhou na eternidade. Nenhum publico: a agua e o céo por cima. Onde achas ahi a franja de algodão?
— Senhor, eu sou, como sabeis, o espirito que nega.
— Negas esta morte?
— Nego tudo. A misanthropia póde tomar aspecto de caridade; deixar a vida aos outros, para um misanthopo, é realmente aborrecel-os...
— Rethorico e subtil! exclamou o Senhor. Vae, vae, funda a tua egreja; chama todas as virtudes, recolhe todas as franjas, convoca todos os homens... Mas, vae! vae!
Debalde o Diabo tentou proferir alguma cousa mais. Deus impuzera-lhe silencio; os seraphins, a um signal divino, encheram o céo com as harmonias de seus canticos. O Diabo sentiu, de repente, que se achava no ar; dobrou as azas e, como um raio, cahiu na terra.


III

A boa nova aos homens

Uma vez na terra, o Diabo não perdeu um minuto. Deu-se pressa em enfiar a cogula benedictina, como habito de boa fama, e entrou a espalhar uma doutrina nova e extraordinaria, com uma voz que reboava nas entranhas do seculo. Elle promettia aos seus discipulos e fieis as delicias da terra, todas as glorias, os deleites mais intimos. Confessava que era o Diabo; mas confessava-o para rectificar a noção que os homens tinham d'elle e desmentir as historias que a seu respeito contavam as velhas beatas.

— Sim, sou o Diabo, repetia elle; não o Diabo das noites sulphureas, dos contos somniferos, terror das creanças, mas o Diabo verdadeiro e unico, o proprio genio da natureza, a que se deu aquelle nome para arredal-o do coração dos homens. Vede-me gentil e airoso. Sou o vosso verdadeiro pae. Vamos lá: tomae d'aquelle nome, inventado para meu desdouro, fazei d'elle um tropheo e um labaro, e eu vos darei tudo, tudo, tudo, tudo, tudo, tudo...

Era assim que fallava, a principio, para excitar o enthusiasmo, espertar os indifferentes, congregar, em summa, as multidões ao pé de si. E ellas vieram; e logo que vieram o Diabo passou a definir a doutrina.
A doutrina era a que podia ser na bocca de um espirito de negação. Isso quanto á substancia, porque, acerca da fórma, era umas vezes subtil, outras cynica e deslavada.

Clamava elle que as virtudes acceitas deviam ser substituidas por outras, que eram as naturaes e legitimas. A soberba, a luxuria, a preguiça, foram rehabilitadas, e assim tambem a avareza, que declarou não ser mais que a mãe da economia, com a differença que a mãe era robusta, e a filha uma esgalgada. A ira tinha a melhor defeza na existencia de Homero; sem o furor de Achilles, não haveria a Illiada: "Musa, canta a colera de Achilles, filho de Peleu"... O mesmo disse da gulla, que produziu as melhores paginas de Rabelais, e muitos bons versos do Hyssope; virtude tão superior, que ninguem se lembra das batalhas de Lucullo, mas das suas ceias; foi a gulla que realmente o fez immortal. Mas, ainda pondo de lado essas razões de ordem litteraria ou historica, para só mostrar o valor intrinseco d'aquella virtude, quem negaria que era muito melhor sentir na boca e no ventre os bons manjares, em grande copia, do que os máos boccados, ou a saliva do jejum? Pela sua parte o Diabo promettia substituir a vinha do Senhor, expressão metaphorica, pela vinha do Diabo, locução directa e verdadeira, pois não faltaria nunca aos seus com o fructo das mais bellas cepas do mundo. Quanto á inveja, prégou friamente que era a virtude principal, origem de prosperidades infinitas; virtude preciosa, que chegava a supprir todas as outras, e ao proprio talento.

As turbas corriam atraz d'elle, enthusiasmadas. O Diabo incutia-lhes, a grandes golpes de eloquencia, toda a nova ordem de cousas, trocando a noção d'ellas, fazendo amar as perversas e detestar as sans.

Nada mais curioso, por exemplo, do que a definição que elle dava da fraude. Chamava-lhe o braço esquerdo do homem; o direito era a força; e concluia: Muitos homens são canhotos, eis tudo. Ora, elle não exigia que todos fossem canhotos; não era esclusivista. Que uns fossem canhotos, outros dextros; acceitava a todos, menos os que não fossem nada. A demonstração, porem, mais rigorosa e profunda, foi da venalidade. Um casuista do tempo chegou a confessar que era um monumento de logica. A venalidade, disse o Diabo, era o exercicio de um direito superior a todos os direitos. Se tu pódes vender a tua casa, o teu boi, o teu sapato, o teu chapéo, cousas que são tuas por uma razão juridica e legal, mas que, em todo caso, estão fóra de ti, como é que não pódes vender a tua opinião, o teu voto, a tua palavra, a tua fé, cousas que são mais do que tuas, porque são a tua propria consciencia, isto é, tu mesmo? Negal-o é cahir no absurdo e no contradictorio. Pois não ha mulheres que vendem os cabellos? não póde um homem vender uma parte do seu sangue para transfundil-o a outro homem anemico? e o sangue e os cabellos, partes physicas, terão um privilegio que se nega ao caracter, á porção moral do homem? Demonstrando assim o principio, o Diabo não se demorou em expôr as vantagens de ordem temporal ou pecuniaria; depois, mostrou ainda que, á vista do preconceito social, conviria dissimular o exercicio de um direito tão legitimo, o que era exercer ao mesmo tempo a venalidade e a hypocrisia, isto é, merecer duplicadamente.

E descia, e subia, examinava tudo, rectificava tudo. Está claro que combateu o perdão das injurias e outras maximas de brandura e cordialidade. Não prohibiu formalmente a calumnia gratuita, mas induzui a exercel-a mediante retribuição, ou pecuniaria, ou de outra especie; nos casos, porém, em que ella fosse uma expansão imperiosa da força imaginativa, e nada mais, prohibia receber nenhum salario, pois equivalia a fazer pagar a transpiração. Todas as fórmas de respeito foram comndenadas por elle, como elementos possiveis de um certo decoro social e pessoal; salva, todavia, a unica excepção do interesse. Mas essa mesma excepção foi logo eliminada, pela consideração de que o interesse, convertendo o respeito em simples adulação, era este o sentimento applicado e não aquelle.

Para rematar a obra, entendeu o Diabo que lhe cumpria cortar por toda a solidariedade humana. Com effeito, o amor do proximo era um obstaculo grave á nova instituição. Elle mostrou que essa regra era uma simples invenção de parasitas e negociantes insolvaveis; não se podia dar ao proximo senão indifferença; em alguns casos, odio ou desprezo. Chegou mesmo á demonstração de que a noção do proximo era errada, e citava esta phrase de um padre de Napoles, aquelle fino e lettrado Galiani, que escrevia a uma das marquezas do antigo regimen: "Leve a breca o proximo! Não ha proximo!" A unica hypotese em que elle permittia amar ao proximo era quando se tratasse de amar as damas alheias, porque essa especie de amor tinha a particularidade de não ser outra cousa mais do que o amor do individuo a si mesmo. E como alguns discipulos achassem que uma tal explicação, por metaphysica, escapava á comprehensão das turbas, o Diabo recorreu a um apologo: — Cem pessoas tomam acções de um banco, para as operações communs; mas cada accionista não cuida senão dos seus dividendos: é o que acontece com os adulteros.
Este apologo foi incluido no livro da sabedoria.


IV

Franjas e franjas

A previsão do Diabo verificou-se. Todas as virtudes cuja capa de velludo acabava em franja de algodão, uma vez puxadas pela franja, deitavam a capas ás ortigas e vinham alistar-se na egreja nova. Atraz foram chegando as outras, e o tempo abençoou a instituição. A egreja fundara-se; a doutrina propagava-se; não havia uma região do globo que não a conhecesse, uma lingua que não a traduzisse, uma raça que não a amasse. O Diabo alçou brados de triumpho.

Um dia, porém, longos annos depois, notou o Diabo que muitos dos seus fieis, ás escondidas, praticavam as antigas virtudes. Não as praticavam todas, nem integralmente, mas algumas partes e, como digo, ás ocultas. Certos glutões recolhiam-se a comer frugalmente trez ou quatro vezes por anno, justamente em dias de preceito catholico; muitos avaros davam esmolas, á noite, ou nas ruas mal povoadas; varios delapidadores do erario restituíam-lhe pequenas quantias; os fraudulentos fallavam, uma ou outra vez, com o coração nas mãos, mas com o mesmo rosto dissimulado, para fazer crer que estavam embaçando os outros. A descoberta assombrou o Diabo. Metteu-se a conhecer mais directamente o mal, e viu que lavrava muito. Alguns casos eram até incomprehensiveis, como o de um droguista do Levante, que envenenara longamente uma geração inteira, e com o producto das drogas soccorria os filhos das victimas. No Cairo achou um perfeito ladrão de camellos, que tapava a cara para ir ás mesquitas. O Diabo deu com elle á entrada de uma, lançou-lhe em rosto o procedimento; elle negou, dizendo que ia alli roubar o camello a um drogomano; roubou-o, com effeito, á vista do Diabo e foi dal-o de presente a um muezzin que rezou por elle a Allah. O manuscripto benedictino cita muitas outras descobertas extraordinarias, entre ellas esta que desorientou completamente o Diabo. Um dos seus melhores apostolos era um calabrez, varão de cincoenta annos, insigne falsificador de documentos, que possuia uma bella casa na campanha romana, telas, estatuas, bibliotheca, etc. Era a fraude em pessôa; chegava a metter-se na cama para não confessar que estava são. Pois esse homem, não só não furtava ao jogo, como ainda dava gratificações aos creados. Tendo angariado a amizade de um conego, ia todas as semanas confessar-se com elle, n'uma capella solitaria; e, comquanto não lhe desvendasse nenhuma das suas acções secretas, benzia-se duas vezes, ao ajoelhar-se e ao levantar-se. O Diabo mal poude crêr tamanha aleivosia. Mas não havia que duvidar; o caso era verdadeiro.

Não se deteve um instante. O pasmo não lhe deu tempo de reflectir, comparar e concluir do espectaculo presente alguma cousa analoga ao passado. Voou de novo ao céo, tremulo de raiva, ancioso de conhecer a causa secreta de tão singular phenomeno. Deus ouviu-o com infinita complacencia; não o interrompeu, não o reprehendeu, não triumphou, sequer, d'aquella agonia satanica. Poz os olhos n'elle e disse-lhe:

— Que queres tu, meu pobre Diabo? As capas de algodão têm agora franjas de seda como as de velludo tiveram franjas de algodão. Que queres tu? É a eterna contradicção humana.


Do livro de contos "Histórias sem data", edição de 1946.

26 de dez. de 2008

This is who we are...





The Time is near.

24 de dez. de 2008

A Todos Vocês

Hoje eu não vou jogar minha carga sobre vocês.

Hoje eu não vou ser o que vocês queriam que eu fosse.
Hoje eu estou me despedindo de vocês.
Hoje, nós estamos sendo apresentados uns para os outros:

— Prazer, eu sou você.
— Morra. Você é nada...

21 de dez. de 2008

Conclave

A despeito de tudo o que eu digo aqui (e penso), vou me unir ao sangue de meu sangue.

Vós que Sois sem nome, dai-me forças!




Pois vou precisar.

17 de dez. de 2008

Feliz Ano Morto

“Vamos, vamos. Eu lhe direi onde estamos. Estamos na mais remotamente distante região da mente humana, um subterrâneo difuso e  inconsciente. Um radiante abismo, onde as pessoas encontram-se consigo mesmas...

Inferno, Netley. Estamos no Inferno.”

("From Hell", de Alan Moore e Eddie Campbell)


Uma criança largada confiante nos braços da mãe.
Uma criança atirada negligentemente num rio.

Um curimbatá tirado do rio, mordendo o anzol.
Um rio morto onde capivaras nadam.

Nós que construímos casas em encostas de morros.
Nós que morremos com as chuvas que não queremos.

Uma criancinha comendo terra na porta da minha casa.
Uma prostituta de onze anos sendo morta pelo seu gigôlo.

Nós, que temos medo.
Nós, que disparamos um 'pente' de 15 balas contra nós mesmos.

Uma mãe ralhando com o filho mijão.
Um menino enfrentando sozinho os monstros das trevas.

Um idiota que escapa de uma sapatada.
Os prisioneiros de Guantanamo.

O aquecimento global.
O resfriamento do mundo.

Os economistas.
Os cegos que guiam cegos.

Tua mãe.
Nossa Mãe.

As mentiras dos que sabem.
As verdades dos que calam.

Nós, que somos o que somos.
Nós, que não valemos o que cagamos.

E a chuva cai.

16 de dez. de 2008

Porque não se atira sapato em barata

15 de dez. de 2008

Para o meu "amor".




"Você me tem?

Você me odeia?"

12 de dez. de 2008

Mensagem

Espero que todas as pessoas que inadvertidamente passaram por aqui este ano tenham uma feliz conclusão de ano e que o próximo seja melhor que o que passou. Nos encontramos em 2009.


... enquanto eu amago o meu inferno astral...

5 de dez. de 2008

Bomba-relógio

... tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque...

“— Ela está armada outra vez!

... tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque...

— Eu sairia de perto, se fosse você!”

... tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque, tique-taque...

1 de dez. de 2008

Tudo tem um começo...

... e tudo tem um fim. Já vi isso antes; muito, muito tempo atrás...

Mas não aqui; não agora. Por enquanto, pelo menos...


É quase tudo o que nós somos, e quase nada do que nós sabemos.





"... she's so beautiful!"


30 de nov. de 2008

Obeah

Uma mecha dos seus cabelos, aparas de suas unhas,

Um maço de losna, a bexiga de um baiacu.

Minhas lembranças de você, meu ódio, meu amor...

Terra de cemitério, com a graça de Baron Samedi e Maman Brigit;

Velas pretas e vermelhas; uma garrafa de rum; uma noite de lua cheia.

Legba
, acorde das águas!



Receita para fazer zumbi.

27 de nov. de 2008

"Only the End of the World again"*

2008:

Como de costume, começou com promessas vazias.

Como de costume, terminou com mentiras sórdidas.

Entre o começo e o término, alguma coisa mudou, não necessariamente para melhor.


Carpe diem.

18 de nov. de 2008

O devorador de medos

Você sabe do que se trata?
Aquela sensação de que o mundo vai se acabar,
Aquela incapacidade de olhar para dentro de você,
Aquilo tudo que você não admite que você é?
É isso que eu vou tomar de você...

Num certo momento, você vai se sentir mais leve,
Sem aquele incômodo que o(a) leva a olhar sempre
                                                               [por sobre o ombro.]
E a vida vai parecer mais colorida e perfumada;
Você vai sorrir, vai cantar e dançar como em criança.
Vai ser grato(a) por eu tê-lo(a) amaldiçoado...

Porque eu lacrei a porta que leva para dentro de você.
E mesmo que você pudesse olhar por alguma fresta nela
A única coisa que veria seria um salão abandonado,
E a mesa com os restos do banquete
Que eu fiz com o que havia de humano em você...

9 de nov. de 2008

Cartas de um homem na solitária

De Nazim Hikmet, 1938

1
Eu gravo seu nome na pulseira de meu relógio
com minhas unhas.
Onde estou, você bem sabe,
não tenho um canivete de cabo perolado
(eles não me dão nada afiado)
ou um plátano com a copa entre as nuvens.
Árvores podem crescer no terreiro
mas eu não tenho permissão
de olhar para o alto e ver o céu...
Quantos outros haverá aqui?
Eu não sei.
Estou só, longe deles,
eles estão todos juntos, longe de mim.
Falar com qualquer um além de mim mesmo
é proibido.
Então eu falo sozinho.
Mas minha conversa acaba tão aborrecida,
minha querida, que eu canto canções.
E, você bem sabe,
aquela minha voz horrorosa, eternamente desafinada
acaba por me tocar tanto
que meu coração sangra.
E como o orfão desamparado
perdido na neve
daquelas velhas histórias, meu coração
— com pálidos olhos úmidos
e fungando sempre —
só quer se aninhar em seus braços.
E não me envergonha
ser nesse momento
tão fraco,
tão egoísta,
tão humano somente.
Sem dúvda meu estado pode ser explicado,
fisiologicamente, psicologicamente e o que mais.
Ou talvez seja
esta janela gradeada,
este pote de barro,
essas quatro paredes,
que há meses me impedem de ouvir
outra voz humana.

São cinco da tarde, minha querida.
Lá fora,
com seus áridos,
estranhos ruídos,
sua abóbada barrenta,
e um magro cavalo manco,
imóvel na infinitude
— entenda, isto é suficiente para levar alguém à loucura —
lá fora, com toda a sua indústria e toda a sua arte,
uma noite calma desce rubra sobre um espaço sem árvores.
Hoje outra vez, a noite cai subitamente.
Uma luz alumiará o magro cavalo manco,
E o espaço sem árvores, nesse lugar de desesperança,
exposto a minha frente como o corpo de um homem rude,
de repente se encherá de estrelas.
Alcançaremos o invetável fim, ainda uma vez.
quando se diz que o palco está pronto
para a exibição de uma elaborada nostalgia.
Eu, o homem em mim,
de novo exibirei meu costumeiro talento,
e cantarei um lamento fora de moda,
na esganiçada voz de minha infância.
De novo, valha-me Deus, esmagará meu infeliz coração,
ouví-la em meus pensamentos,
tão longe,
como se eu a visse num embaçado espelho quebrado...

2
É primavera lá fora, minha querida esposa, primavera.
Lá de fora, de repente vem o cheiro
da terra fresca, pássaros cantando e todo o resto.
É primavera, minha querida esposa,
o terreno lá fora faisca...
E aqui a cama fervilha de insetos,
a água não congela mais no pote,
e o sol da manhã inunda o concreto...
O sol — todo dia,
agora até o meio-dia
ele vem até mim e se vai,
apaga e acende...
E enquanto o dia se torna tarde, sombras vestem os muros,
o vidro da janela gradeada pega fogo,
              e é noite lá fora,
              uma noite clara de primavera...
E aqui dentro faz a hora mais escura da estação,
resumindo, o demônio Liberdade,
com suas escamas brilhantes e olhos chamejantes,
se apossa do homem em nós
              especialmente na primavera...
Sei disso por experiência, minha querida,
              por experiência...

3
Hoje é domingo.
Eles me trouxeram para tomar sol pela primeira vez
e eu fiquei lá parado, consciente pela primeira vez na vida
              de como o céu é distante,
              de como é azul
              e de como é vasto.
Então eu me sentei respeitosamente no chão.
Me encostei no muro.
Por um instante, nenhuma armadilha no caminho,
nenhuma luta, nenhuma liberdade, nenhuma esposa.
Apenas terra, sol e eu...
Estou feliz.

8 de nov. de 2008

Enquanto isso...

Não me recrime por eu desperdiçar meu tempo sonhando: eu não lhe recrimino por você desperdicar seus sonhos tomando conta do relógio.

29 de out. de 2008

Non sequitur

Estou de volta ao fim de mundo; minha estada a trabalho no ABC paulista foi mais longa do que previsto e na maior parte, pura perda de tempo. Tanto que, logo chegando aqui, fui chamado de volta...

Não fui: posso perfeitamente perder tempo em casa.

Meu velho computador pifou; com peças e sucatas que trouxe da viagem montei outro computador velho. Ele não tem se adaptado muito bem ao calor e a energia elétrica intermitente daqui, mas sou insistente: espero tê-lo em pleno funcionamento até o final desta semana.

Não sei como retomar minha rotina tão rudemente interrompida; suponho que deva começar visitando a blogosfera a partir da época em que parti: talvez funcione.

Esperava reencontrar minha criatividade, ou o pouco dela que me resta, para juntos tentar entreter os poucos visitantes que ainda não perderam a paciência conosco. Mas ela se foi: não deixou bilhete explicando o motivo; na verdade, nem seria necessário. Ela apenas se foi...

O ausente está de volta, mais ausente de si mesmo do que nunca.



Bem-vindos a minha casa vazia.

27 de out. de 2008

Crise econômica 5 x Notas de um Amnésico 0

Há coisa de um ano (1/11/2007), o Bruno dos acepipes escritos / citados descobriu um blog capaz de calcular (por critérios que até hoje não entendo, mas, enfim...) o valor comercial em dólares de um blog. Movido por natural curiosidade, naveguei até lá e qual não foi minha surpresa ao descobrir o suposto valor de minhas Notas:

My blog is worth $4,516.32.
How much is your blog worth?



Nada mal para um blog pretensioso e sem graça, hein? Agora, não tendo nada melhor para fazer e mais uma vez curioso quanto aos possíveis efeitos do atual momento conturbado da economia mundial, refiz a avaliação:


Preciso dizer mais?



Eu digo: devia ter vendido enquanto valia alguma coisa!

23 de out. de 2008

Nota de falecimento:

Noticio o passamento do microcomputador Intel Pentium™ geração II/PCChips M747 BX-Pro™, de que fui o estressado proprietário; atendia pela alcunha de “ferro-velho” (Junkyard Fantasy, quando de suas participações na Parada do Orgulho GLBT). Não foi possível verificar a causa mortis, tão misteriosa quanto os inúmeros travamentos, chiliques e bebedeiras a que era dado, o pobre.

Deixa os periféricos: monitor Sampo™ (3ª união), teclado Satellite™, mouse Genius™, unidade de leitura de CD-ROM SONY™ e as placas offboard: fax/modem U.S. Robotics™, LAN VIA Rhine III™ e vídeo Trident™, além de leitor de disquetes 3½” e dispositivo de memória RAM de 128 MB (ambos “genéricos”), HD Fujistu™ de 8 GB (2ª união) e os sistemas operacionais Windows NT4/98/2000™; a fonte de alimentação, genérica, encontra-se em estado de coma induzido e suas chances de recuperação são incertas.

Sua última vontade expressa, segundo o documento electric_funeral.txt, foi ter seu gabinete embalsamado com óleo desengripante e vaselina retificada, envolto em faixas de plástico-bolha e transladado para o Egito, sendo então depositado no chamado "Sarcófago" da Câmara do Rei na Grande Pirâmide de Gizé, na planície do mesmo nome na cidade do Cairo.

(A vontade atual do proprietário é reduzí-lo a pó com uma marreta de 5 quilos).

Seu epitáfio:

01000110011011110110100100100000011101000111010101100100011011110010 000001100011011101010110110001110000011000000010000001100100011011110010 0000010000100110100101101100011011000010000001000111011000010111010001100101011100110010000000100001

Traduzido do código binário:

Foi tudo culpa do Bill Gates!

2 de out. de 2008

Inventário de idéias perdidas

Eu tinha uma idéia fantástica para postar agora. E esqueci...!


Isso tem que ficar registrado! Agora!!



Tenho algo a confessar: eu não esqueci a idéia, encontrei anotada num saquinho de papel marrom no bolso da minha calça!

Aliás, não era para este blog, mas para "Os Doentes".

E nem era uma idéia tão boa assim...

1 de out. de 2008

(Walkin' Thru The) Sleepy City*

Não nasci aqui, mas pouco importa, minha cidade natal fica a quarenta minutos de caminhada (meia hora, com tempo bom, se eu estiver disposto); apenas tirei um tempo para caminhar por essas ruas que eu desconheço tão bem, depois da chuva que caiu.

 

It’s always raining in Sunny Side Road...**

 

Fico pensando em vida e fracasso. Vida não é nada demais, estamos todos nessa; já o fracasso me fascina desde muito tempo: gostaria de sentir que não fiz nada de minha vida, que meu tempo aqui foi jogado fora (já ouvi isso, mais de uma vez) e que, de alguma forma, a posteridade vai me cobrar o que não realizei. Sentir o peso do fracasso, enfim. Quase senti isso na adolescência.***

 

Não sinto isso. Não sinto nada, na verdade.

 

Por alguma razão meio obscura, gosto disso: sinto-me como Kwai Chang Caine, exilado de um país que não era o seu (de todo, pelo menos) para um outro país que também não era o seu, tentando viver segundo uma filosofia que funciona dentro de templos Shaolin. O detalhe marcante é ter de vivê-la num ambiente que a ignora, quando não despreza.

E então a chuva recomeça a cair. Lembro de quanto andei debaixo da chuva por essa cidade, vendo o movimento nos bares, nas igrejas, nas casas e fábricas, me perguntando o porquê de tudo aquilo, o porquê de mim mesmo naquilo tudo.


Estou aqui por causa dos meus amigos.


Até hoje, não encontrei resposta àquelas perguntas e estranhamente, eu, que já fui apelidado de 'porquê' por uma mãe desesperada de não encontrar explicações que satisfizessem o filho curioso, não faço a menor questão de ter respostas, creio que entendi o significado das perguntas: lila.


Sânscrito - लीला. Passatempo.


Faço perguntas porque tenho capacidade de fazê-las e não porque elas tenham de ser respondidas. E o Universo me dá material para formular novas perguntas porque talvez, como eu, não tenha nada melhor para fazer...

 

 

 

*Título de canção do álbum "Metamorphosis", Rolling Stones, 1975.

**Trecho de "Exquisitely Bored", do álbum "All the Best Cowboys Have Chinese Eyes", Pete Townshend (The Who), 1982.

***Mas afinal, quem não sentiu?

27 de set. de 2008

Evangelho segundo um Amnésico

Tomo Terceiro: Do Paraíso


1- O Paraíso é o Inefável*.

2- O Inefável esperimentareis no devido tempo.

3- Ou não.

Finda o terceiro capítulo.



Finda a revelação.

*Latim imperial: 1. Que não se pode exprimir por palavras; indizível.
Dicionário Aurélio Séc. XXI

Só por curiosidade ociosa, as outras partes estão aqui e aqui.

13 de set. de 2008

A maldição da Amnésia Gnoseológica

 




... o que era mesmo que eu ia escrever aqui?!

30 de ago. de 2008

Arbeit Macht Frei

A expressão nazista da 'exploração do homem pelo homem' sempre me impressionou, nada mais concisamente preciso do que Liberdade Pelo Trabalho. E na minha presente situação, a frase cai como luva: tendo viajado pela terceira vez no ano para o ABC paulista a trabalho, fui libertado da minha insônia, do mau hábito de acompanhar o progresso da blogosfera e principalmente de minha inspiração.

Uma pena não me ver livre da vontade de passar as noites em claro, ler e escrever...


De um vagabundo e agnóstico genético
.

14 de ago. de 2008

No Banheiro sem Ar Condicionado do Trópico no Tempo dos Assassinos das Laranjas de Hyeronimus do Mundo do Sexus


“Um gênio à procura de emprego é uma das coisas mais tristes do mundo.”



Tributo a um outro outsider: eles tomam nossas vidas, nós assaltamos as deles e o mundo continua a girar sabe-se lá para onde...

31 de jul. de 2008

Sarabanda


Eu te daria rosas,
Se não estivesses
Desde já sangrando.

Comeria tua língua,
Malgrado sejas
Cega de nascença.

Eu te daria voz,
Não tivesses sempre
O horror no olhar.

Teu coração consolaria,
Para saboreares
Melhor tua angústia.

Eu te daria amor,
Carícia com chicote
De arame farpado.

Teu alento fétido
Como uma grinalda
De serpentes mortas.

Eu te daria fé,
Veneno que a existência
Instila em nossas vísceras.

Eu te daria vida...

E se tu chorasses?
E se tu gritasses?
E se tu morresses?

Eu te daria rosas...

22 de jul. de 2008

Mais definições pessoais:

Elite: Os dejetos da sociedade que boiam por cima das outras camadas sociais, tal como o resíduo de sílica* flutua sobre o metal incandescente;

Cineasta: Fungo malcheiroso que cresce no Brasil por falta de diretores cinematográficos;

Televisão: Com as indústrias farmacêutica, bélica e biogenética, prova que o extraordinário avanço tecnológico da humanidade é perfeitamente compatível com a imbecilidade crônica;

Best-seller: Uma maneira eficaz de tornar um livro algo supérfluo (quando não prejudicial);

Mirmecocida**: Uma fase (insana?) da minha quase esquecida infância;

Tempo: Substância radioativa — diminue pela metade após um prazo determinado — geralmente a partir dos trinta anos de idade;

Raciocínio: Está se tornando cada vez mais difícil;

Emoção: Está se tornando cada vez mais intolerável;

Ação: Está se tornando cada vez mais inútil;

Vida: Menos que uma maldição, um desafio; menos que um desafio, uma carga; menos que uma carga, um prazer; menos que um prazer, um hábito difícil de largar...


*
Mineral componente da areia, usado na forja do aço.
** Assassino de formigas!

18 de jul. de 2008

O que mais falta acontecer?!

As manchas solares não aparecem...


... e a "coroa" se rompe (a rajada de "vento solar" deve atingir a Terra amanhã).




Dados 'gentilmente cedidos' pelo site Space Weather (em inglês).

15 de jul. de 2008

Satyagrahaḥ

"Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros."

9 de jul. de 2008

Brasil, potência mundial!


5 de jul. de 2008

Além do "Centésimo Primeiro"

Com a transliteração de três obras de autores favoritos (dentre tantos outros), este blog atingiu sua centésima postagem. Como, não perguntem: eu não saberia responder.
O fato é que aqui está ele; como no início, uma nau sem bússola sob um céu sem estrelas, ameaçada por invisíveis arrecifes e acossada pelo canto traiçoeiro de sereias escondidas.

Dramático, não? Somente nos termos.

Iniciadas despretenciosamente, minhas notas ganharam leitores/colegas donos de blogs dentre os melhores existentes, além de comentários altamente favoráveis (pelos quais sou muito grato!); por outro lado, sinto uma certa pressão (auto-imposta, me apresso a declarar!) para manter tanto a freqüência quanto o ‘nível’ das postagens. Acredito, porém, que esteja perdendo a ‘espontaneidade’ e o resultado é reduzida quantidade de postagens dos últimos meses, se bem que minha atual crise depressiva possa ter alguma participação... Mas, tudo somado, não há com que se preocupar!

Afinal, desde sua viagem inaugural, essa ‘barca do Inferno’ estava destinada a singrar pelos mares revoltos da casualidade e cantar seus ‘autos’ contra a carência de objetivo e inspiração, fazendo do cotidiano mito e cantando seus heróis rumo ao Parnaso feliz das Musas, lar de minha amada Mnemosine, que fica além dos Oceanos conhecidos, para as bandas do Poente.

Em frente a todo pano! Terra Incognita da Felicidade, prepare seus portos e convoque suas damas: a nave está a caminho!

1 de jul. de 2008

Três Poemas de Dor e Mistério

Um Sonho Dentro de um Sonho

Edgar Allan Poe

Receba meu beijo sobre a fronte!
E, em apartando-nos doravante,
Permiti-me que te conte -
Não te enganaste, ao ter suposto
Que minha vida tem sido um sonho;
‘Inda que a esperança quede extinta,
Pela noite ou pelo dia,
Numa visão, ou em nada ainda,
Estaria assim menos perdida?
Tudo o que vemos ou supomos,
Será apenas um sonho dentro de um sonho.

Me encontro em rumorosa
Praia bravia e tormentosa,
Tendo eu a mancheia,
De dourados grãos de areia -
Quão poucos! E tão céleres, contudo
Por dentre os dedos vão-se ao fundo,
E eu soluço! - E eu soluço!
Oh Deus! Não lhes poderia eu reter
A custa de mais forte os prender?
Oh Deus! Não há um só que eu possa
Livrar da onda impiedosa?
Será tudo o que vemos ou supomos
Senão um sonho dentro de um sonho?


Os Horrores do Sono

Emily Brönte

O sono alegria não me traz,
Recordação a nunca terminar,
Em mistério minha alma se desfaz
E vive a suspirar.

O sono descanso não me traz;
Dos extintos possa a sombra,
Meus olhos despertos não ver jamais,
Rodeando minha cama.

O sono esperança não me traz,
As profundezas do sono os vai evocar,
E sua triste imagem faz,
Aumentar meu pesar.

O sono vigor não me traz,
Para lutar, nenhuma força nova,
Apenas singro em revolto mar,
Uma vaga inda mais trevosa.

O sono amizade não me traz,
Que traga ajuda e anelo,
Com que desprezo me vêm eles mirar,
E eu desespero.

No sono desejo não há,
Em que meu dorido coração folgue,
Tudo em mim quer se olvidar,
No sono eterno da morte.


Litania a Satã

Charles Baudelaire

Oh, primogênito entre os Anjos e deles o mais sábio,
Oh, caído Deus, dos céus pelo destino derribado,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Oh, primeiro dos exilados vitimados pela intriga,
A quem, porém, tem o ódio tornado mais forte ainda,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Oh, Rei subterrâneo, onisciente,
Pacificador do homem, eterno descontente,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Aos leprosos e excomungados tendes mostrado,
Que Paixão é o Paraíso lá embaixo,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Por vossa senhora, a Morte, nos é garantida,
A Esperança, imperecível concubina,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Tendes dado aos Culpados a face tranqüila,
Que amaldiçoa a ralé que cerca a guilhotina,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Conhecidas vos são as entranhas da Terra zelosa,
Onde Deus escondeu gemas deveras preciosas,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Vossa é a mão que se estende salvadora,
Àquele que, em seu sono, pelos telhados perambula,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Pelo poder vosso o Ébrio de titubeantes pés,
Cruza as tumultuadas ruas sem qualquer revés,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Para consolo de nossa fraqueza nos destes o uso,
Arguto e eficiente da pólvora e do chumbo,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Vosso terrível nome como em piche está escrito,
Na implacável fronte dos homens ricos,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Levam vossos passos a
secretas vizinhanças obscuras,
Onde mulheres, por amor, imploram pela tortura,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

Pai daqueles a quem Deus, com furor tempestuoso,
Lançou fora do Paraíso com espada e fogo,
Satã, enfim, apiedai-vos de nossa dor.

20 de jun. de 2008

Ventos Uivantes

De que valeu minha obstinação, meu ódio? De que adiantou o castigo imposto àqueles que me desprezaram toda a vida, ao custo de me desprezar a mim mesmo?

Fiz de minha vida o que queria que ela fosse; sou o senhor absoluto de um deserto de cinzas de esperanças calcinadas, salpicado dos esqueletos monstruosos de minhas lembranças. Sob um céu de emoções cor de sangue coagulado, sou Rei no Nada em que me converti e o trovão que chacoalha o horizonte morto é minha gargalhada de desalento.

Terei errado? Deveria me arrepender e engolir o orgulho ferido? Morrer escravo de outros, eu que nasci senhor de mim mesmo?

Alegrias, tristezas... meras espirais de fumaça no ar congestionado: minha herança pela magna opus de destruição rancorosa. Irracional? De modo algum: exaustivamente planejada nas noites insones desde a infância, obsessivamente executada na monomania de um coração ofendido, sofregamente fruída no prazer demente da consciência dilacerada, dilacerada, dilacerada. Não, eu não perdi nenhum detalhe.

Sou um esteta do desperdício, um artista do inútil, zero à enésima potência.

Amigos? Amores? Para que?
Quem quereria caminhar comigo rumo ao Vazio?

Cansaço. Insensibilidade. Indiferença. Não quero pensar, não quero falar, não quero ver ninguém, não quero sentir; não há diversão ou aborrecimento no meu caminho. Não há nada senão contemplar a devastação, ao vento áspero que castiga olhos que não sabem chorar...

18 de jun. de 2008

Em manutenção, ou
Comportamentos de risco & suas conseqüências

Os dias alternam violentamente calor e frio aqui no fim-de-mundo (= gripe!). Meu computador continua à beira de uma falência múltipla de dispositivos, e para completar mergulhei de cabeça numa das minhas periódicas crises depressivas. Life is good...

Com tudo isso, pus minha paranóia informática de lado e nos últimos dias (ou semanas, já nem sei) deixei de fazer a manutenção rotineira no ferro-velho. Os travamentos foram ficando cada vez mais freqüentes, a conexão com a internet inviável, minha paciência se esgotando em progressão geométrica: estive a ponto de cometer um informaticídio!

Uma brecha, porém, se fez nesse cenário sombrio e com muito custo e paciência acabo de proceder a um check-up em regra na máquina; descobri contatos elétricos sujos, cabos rompidos, peças móveis engripadas, o sistema operacional entupido de lixo e, de quebra, dois trojan horses e um backdoor infectando-o. Minha inatividade desses dias ganhou nome e sobrenome: imprudência e negligência. Combina comigo...
Assegurada alguma sobrevida ao micro, é minha vez de tentar sair do fosso. E eu sempre saio, isso é líquido e certo. Nem que seja pior do que quando entrei...



Saudações, povo da superfície!

8 de jun. de 2008

O martírio do artista, de Augusto dos Anjos

 "Arte ingrata! E conquanto, em desalento,
A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,
Busca exteriorizar o pensamento
Que em suas fronetais células guarda!


Tarda-lhe a idéa! A inspiração lhe tarda!
E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento,
Como o soldado que rasgou a farda
No desespero do último momento!


Tenta chorar e os olhos sente enxutos!...
É como o paralítico que, à mingua
Da própria voz e na que ardente o lavra


Febre de em vão falar, com os dedos brutos
Para falar, puxa e repuxa a língua,
E não lhe vem à boca uma palavra!"

5 de jun. de 2008

Piada sem graça

Meu computador subiu no telhado...

25 de mai. de 2008

Um aviso ao incautos

O autor deste blog acredita firmemente em compromissos. Por isso está tão inclinado a rompê-los...;

O arrendatário deste espaço é um pensador. Esta é a razão de estar sempre “fazendo das tripas coração”;

Aqui, a vida se desfaz em sonho. E o sonho gera teiús comedores de pesadelos;

Ontem foi amanhã.

Amanhã será hoje.

Hoje... esperem e verão!

Sentimento é escravidão. Escravidão é compromisso. Compromisso é sonho. Sonho é libertação. Libertação é pensamento. Pensamento é ilusão. Ilusão é sentimento...

E daí?

Basta!

24 de mai. de 2008

Koan

Numa sala sem paredes, janelas e portas estão trancadas: por dentro ou por fora?

17 de mai. de 2008

Sobre ausências prolongadas, datas esquecidas, chances desperdiçadas e ‘déjà vu’¹

Já li não sei onde que, via de regra, um blog que deixe de ter seu conteúdo atualizado por mais de um mês irremediavelmente deixa de ser lido; abandonado há dois, talvez fosse o caso de mudar o nome do meu para Notas Cadavéricas...

Não que fosse minha intenção: sem serem grande coisa, estas minhas notas acabaram por ocupar a parte central da minha vida (para bem ou para mal, não importa) e o que eu menos queria é que minha linha de raciocínio fosse interrompida (outro parêntese: minhas ‘linhas de raciocínio’ costumam durar semanas; coisa de monomaníaco).2

Aconteceu, porém, de haver a coincidência entre a necessidade profissional de um velho amigo e a minha de saldar uma já lendária conta de bar. Como vivo de expedientes, me pareceu uma boa ocasião de matar três coelhos com uma só cajadada: ajudar um camarada por um curto período, reforçar outros laços de amizade e limpar meu nome na praça. Wunderbar!3

Doce ilusão: o tripalium4 ao qual voluntariamente me submeti me prendeu por mais tempo que o esperado (além de eu não ter a menor inclinação para a instalação e manutenção de sistemas de segurança); meus amigos são difíceis de se achar, em horário comercial ou fora dele e minha estada forçada por mais trinta dias acabou por me tomar boa parte do dinheiro que levantei. É sempre assim: quanto mais cuidadosamente eu planejo minhas ações, menos elas correm como eu planejei...
E, com tudo isso, o que mais me custa aceitar é a ausência da blogosfera. Sinto falta de partilhar a minha falta de talento e companheirismo com o talento e amizade que nela descobri.

Então comecei a sonhar com a volta ao fim-de-mundo (quem diria que teria saudades daqui?), esperando retomar minha vida do ponto em que ela de certa forma parou liberando o furioso enxame de insetos venenosos que zumbe no meu cérebro e do qual, sabe-se lá por qual motivo, vocês parecem gostar. E o que acontece então?

Nada.

A triste verdade: escrever, no meu caso, é fruto do ócio e mais, do ócio forçado: estar aberto, por falta do que fazer, aos acontecimentos dentro e fora da consciência, grandes ou pequenos (com preferência aos de dentro e aos pequenos); uma tentativa de manter vivo meu modorrento espírito. E a última coisa que tive nesses dois meses foi ócio; o resultado foi algo parecido com o coma criativo que me acometeu por mais de 2o anos entre o final de minha vida escolar e o início deste blog que, por sua vez, foi uma reação ao surto de síndrome de pânico que sofri há dois anos (me pergunto se vocês percebem meu temor de uma recaída...).
Eis então que os tais insetos venenosos estão curiosamente quietos; estou vazio como o copo a minha frente.
Sem contar que o ferro-velho que eu insisto em chamar de computador dá sinais de definitiva agonia: minhas últimas tentativas de pô-lo para funcionar esbarraram na famigerada tela azul das versões arcaicas do suposto sistema operacional de Mr. Gates of Hell (meu reino por um Linux!).

Intermezzo
Cena de cinema: tomada do alto com os braços abertos, gritando aos céus inclementes “Por quê?! Por quê?!”


Primeira fase da choradeira concluída; passemos à próxima.

***

No dia 21 de abril passado meu blog completou um ano de existência e eu sequer mencionei o fato. Estava em meus planos fazê-lo, mas por motivos já alegados, não foi possível; agora, numa tentativa de vencer a inércia, aborrecerei-os com um comentário a posteriori (calma, agora serei breve!).

Vocês já sabem, suponho eu, que estas notas surgiram como um dos tantos recursos de que lanço mão para manter minha um tanto frágil sanidade mental; digo que elas me deram muito mais: mudaram o conceito altamente negativo que eu tinha a respeito das inteligência e sensibilidade na Internet; criaram laços de amizade cuja importância para mim é muito maior que minha capacidade em retribuí-los e deram (a despeito do que eu declarei na minha última postagem) um objetivo à uma vida à deriva.


Intermezzo
Provavelmente estou esquecendo de mais alguma coisa importante, mas vocês hão de convir que, sendo amnésico...

Que mais posso dizer senão muitíssimo obrigado a todos vocês, presentes ou ausentes?
No momento eu não sei, exceto que este espaço é tão seu quanto meu. Espero de todo o coração que não lhes seja uma total perda de tempo...

Que venha outro ano!

***

Dois tempos:

Data: início do ano - Perdi a oportunidade de investigar o surgimento de estranhas ‘marcas’ nos canaviais da região onde moro;

Data: 22/04 - Durante minha estada no ABC paulista, ocorre um tremor de terra de 5,2 pontos na escala de Richter, o mais forte em já registrado em São Paulo e eu, estando no nível do chão, sequer senti!

Lugar errado, momento errado, pessoa errada...


Coda
Tenho a inquietante impressão que meus textos estão assumindo o tom vago e lamuriento dos primórdios deste blog. “Eterno Retorno”?

Nietzsche explica...




1 Do francês ‘C’est du déjà vu’: aquilo que dá a impressão de já ter sido visto ou presenciado, ou
Neurologia/Psiquiatria: ilusão epiléptica durante a qual o indivíduo interpreta mal objetos que, entretanto, vê bem e que passam a ter, para ele, características anormalmente familiares;
2 Psiquiatria: forma de insanidade mental em que o indivíduo dirige a atenção para um só assunto ou tipo de assunto; fonte: Dicionário Aurélio Século XXI;
3 Alemão: maravilhoso;
4 Latim: antigo instrumento de tortura, raiz da palavra trabalho (leitura sugerida: “O Direito à Preguiça”, de Paul Lafargue).

13 de mai. de 2008

Uma foca no telhado

Dileto leitor:

Eis-me de volta ao lar, com 1198 e-mails na caixa de entrada (tudo spam!), 44 anos completos e sem a menor idéia do que fazer da vida! Alguma alma caridosa teria uma sugestão?


Obs.: o suicídio não é uma opção, penso nisso todos os dias de minha vida!

6 de mai. de 2008

O filósofo e a formiga

Estava Zaratustra Jr. sentado a sombra de uma árvore, quando uma formiga que subia pelo tronco contou-lhe ao pé do ouvido a seguinte fábula:

“Era uma vez um formigueiro em que havia uma larva que não queria se transformar em formiga. As operárias cuidavam dela exatamente como das outras, que iam se desenvolvendo, mas essa continuava obstinadamente sendo larva.
O tempo foi passando, as novas operárias entraram em serviço, e além de cuidar de seus deveres normais, tinham que atender às necessidades da larva que não se transformava.
Assim a vida continuou naquele formigueiro até que, tendo vivido seis vezes mais que uma operária desenvolvida, aquela larva que não se transformara morreu sem dar qualquer contribuição à coletividade e ainda tendo o seu corpo de ser removido da colônia.”

Terminada a sua história, a formiga continuou seguindo rumo ao topo da árvore sob o olhar atento de Zaratustra Jr. que, assim que a perdeu de vista, pensou:

“Ela que não me venha com outra história dessas quando descer!”

7 de mar. de 2008

Into the void again

Este está sendo um ano tumultuado...

Quando eu imaginava que iria ficar quieto no meu fim-de-mundo, estava quase reintegrado na blogosfera e ainda tinha um mistério a desvendar nos canaviais da região, eis que sou chamado de volta à minha terra natal, o ABC paulista...

Mais um mês longe do meu caderno de notas digital. Vai atrapalhar tudo de novo...!

1 de mar. de 2008

Ilações graforréicas, pataphysicas e musicaes

A longuidão, longura, longor das ruas d’ este fim-de-mundo — início-de-século diaforético tiveram o condão de varrer de minhas reminiscências as hiantes questões que me queimavam o cérebro psitáquico. A fome, essa companheira aziaga e a embriaguês, sucedâneo absolutista, colaboravam na depressão de meus fluidos vitalícios de alienação e miséria, o que, no azado interlúdio, haveria de dar lugar a reflexões cintilantes de sentidos atilados. Quid inde?
Quid pro quo.

23 de fev. de 2008

Batalha do Dragão de Madeira contra o Porco de Fogo e o Rato de Terra

Na borda do mundo1 vivia um Dragão com seu tesouro de raras e preciosas pérolas2, que ele defendia ciumentamente dos ataques dos seus encarniçados inimigos, os Espíritos do Tempo.3

Veio então o Porco de Fogo4; sob seu hálito, as pérolas se tornaram fumaça.5

Os céus vibraram com os urros do Dragão. Mas, tendo vindo do mar, a ele retornou e de lá trouxe novos tesouros, poucos mas inestimáveis.6

Ao cair da tarde surgiu o Rato de Terra7 e transformou suas pérolas em carvão.8

A dor do Dragão retumbou pelo paraíso; a criatura celeste voou para o horizonte de encontro ao Sol. Lá queimou até as cinzas, pois era feita de papel de seda.9 E a noite caiu gélida sobre a borda do mundo.10

Ainda há esperança, entretanto: o Sol sempre volta a brilhar sobre o oceano...11





1 Onde moro;
2 Eu e minhas idéias, registradas no computador;
3 Os anos que passam;
4 2007;
5 Em 08/09 do ano passado, uma desastrada tentativa de reinstalação do sistema resultou na formatação total do meu HD principal e na perda dos meus dados;
6 Comecei tudo de novo, com um pequeno e velho HD de reserva;
7 2008;
8 Queimou-se o pequeno e velho HD;
9 De acordo com a tradição chinesa;
10 Minha vontade é ir dormir e só acordar em 2012;
11 O Dragão renasce das águas, novamente de acordo com a tradição. Afinal, o mal nunca morre...

19 de fev. de 2008

Elite da Liberdade

Após uma infinidade de tempo, acuso o recebimento das quatro indicações a dois prêmios que recebi ano passado; foram eles Eu tenho um blog de elite, por Arthurius Maximus e Danilo Moreira e Escritores da liberdade, Arthurius de novo e Bárbara (B.)









Uma palavra sobre o primeiro prêmio. Foi uma promoção do site PutsGrilo.com, cujas regras estão aqui.

Tendo ela sido iniciada em 19/11 do ano passado, vocês percebem que o asno que vos escreve conseguiu perder o prazo e, com isso, impedir a participação de outros (as) blogueiros (as), de modo que sobra apenas o selo, que agora não faz sentido distribuir; honestamente, sinto muito por isso.

Após essa mea culpa (está se tornando um hábito irritante!), minhas indicações para os Escritores da Liberdade são:

Bruno - Acepipes Escritos,
Critical Watcher - Palavras quase ocultas de um ser real...,

Fernanda Passos - Prosa na Veia,

Foxx - Estórias Do Mundo,

Isabela - Nó no Novelo,

João - Chá Laranja,

Jota - Brinquedo Barato,

Juba - Idéias Enroladas,

Lanark - Eutanásia Cultural,

Rob Gordon - Championship Chronicles.

13 de fev. de 2008

Robinson Crusoe por um ano

Há muito tempo atrás, Lorde Sarubiano , do blog Um país chamado UATI me impôs um (ou será uma?) "meme" muito interessante, vejam vocês: "passar exatamente um ano em uma ilha deserta, onde existe uma certa infra-estrutura, mas ela é limitada. Além de você não haverá mais ninguém na ilha, mas você terá acesso a alguns privilégios limitados. Com isso em mente, seguem as perguntas:"


1. Na ilha você terá água a vontade e frutas nativas. Se souber pescar, com sorte vai poder comer um peixe de vez em quando. Fora isso, você terá que escolher apenas um tipo de comida salgada e um tipo de comida doce para comer todos os dias, o ano inteiro (podem ser cruas ou cozidas). Quais você escolhe?

R. Carne de porco e chocolate amargo.

2. Além da água (e, também com sorte, água de côco se você estiver disposto[a] a subir no coqueiro) não há nenhuma outra bebida na ilha, mas você pode também escolher um único tipo de bebida, fria ou quente, alcoólica ou não, para ter à sua disposição ao longo do ano. Qual você escolhe?

R. Vinho tinto seco de mesa (artesanal, de preferência!)

3. Para manter a tradição, você pode também levar um único livro. Que livro você leva?

R." A Magia Sagrada de Abramelin, o Mago" (um ritual de seis meses de duração, objetivando "o Conhecimento e Conversação com o Sagrado Anjo Guardião") Se funcionar, terei tudo o que quiser, sem sair da ilha; senão, terei matado meio ano de forma interessante!

4. Igualmente, você poderá levar um único filme para assistir. Que filme você leva?

R. Dúvida cruel: balanço entre o semidocumentário "Quem somos nós" e "Sonhos", de Akira Kurosawa; se pressionado, provavelmente ficaria com "Sonhos".

5. Você terá um notebook à sua disposição, mas com um único programa instalado. Mas você não pode usar um programa de comunicação (como email ou mensagens instantâneas). Qual programa teria mais utilidade para você e por que?

R. Canopus, programa de Astrologia da fundação australiana Clairvision School. Não sou astrólogo, mas gosto de me manter informado do que acontece nas altas esferas.

6. Você poderá acessar a internet, mas este acesso é limitado a um único site, o ano todo. (Se você escolher o Google, por exemplo, não poderá navegar para os links dos resultados da sua busca, que estão fora do Google). Também não pode ser seu webmail, Meebo e afins ou sites de notícias (o que elimina os portais). Fora isso, não há restrição nenhuma ao tipo de site, inclusive os que permitem comunicação de outros tipos. A qual site você quer ter acesso por um ano e por que?

R. Meu blog Notas de um Amnésico: ele serve como diário e permite alguma comunicação com outras pessoas.

7. Você também poderá ouvir música. Mas, claro, você terá que ouvir a mesma música o ano todo, pois só pode escolher uma. Qual você leva? E se fosse um CD?

R. Uma raga indiana (ou um CD delas), executada(s) por Ravi Shankar.

8. Você poderá escolher um dia do ano para fazer uma única ligação para uma única pessoa, com quem poderá falar por 10 minutos. Para quem você vai ligar, quando e por que?

R. Minha mãe, no dia 12 de abril, para felicitá-la pelo aniversário e ouvir as fofocas de casa.

9. Você poderá escolher um programa de TV para assistir ao longo deste ano na ilha - limitado à freqüência de uma vez por semana. Você só não poderá assistir nenhum tipo de noticiário, fora isso não há restrições. Que programa você quer assistir?

R. Twilight Zone (Além da Imaginação)

10. Quando for seu aniversário, você terá direito a receber uma carta de um(a) amigo(a) ou familiar que tenha uma novidade para contar (sobre si próprio ou não). De quem você gostaria de receber a carta e com qual notícia?

R. Da minha amiga Elaine: quero saber como vai o projeto do roteiro do qual, supostamente, eu deveria participar...

11. Como não queremos que você transforme uma bola de vôlei no seu melhor amigo imaginário e a única pessoa na ilha será você, você terá direito a levar um animal de estimação para lhe fazer companhia (veja como estou facilitando sua vida!). Que tipo de animal você escolhe e por que? É um animal que você já tenha?

R. Como não tenho nenhum, levaria um falcão treinado: além da companhia, teria caça de volataria para nós dois; se bem que, me conhecendo como eu conheço, farei amigos imaginários de qualquer jeito...

12. Do que você acha que sentirá mais falta? (Contato com as pessoas? Tecnologia? Não saber o que está acontecendo no mundo? Etc…)

R. Certamente, o que eu tenho mais dificuldade de cultivar: contato com as pessoas.

13. Por outro lado, o que você acha que será positivo, proveitoso ou benéfico na experiência? Ou divertido?

R. O contato com a natureza livre por parte de um urbanóide (tanto que nem estou pensando em levar cigarros).

14. Por fim, você tem direito a levar 3 outros itens à sua escolha que:
a) não entrem em contradição com nenhuma das perguntas anteriores, b) não seja algo que você vá usar para sair da ilha, como um barco, por exemplo. O que você vai levar e por que?

R. Material de pintura, meu violão e um cubo mágico (quem sabe aprendo a usar algum deles!)



Tendo cumprido meu retiro de um ano, condeno ao mesmo destino:

Juba — Idéias Enroladas;
Danilo Moreira — Em Linhas...;
Fernanda Passos — Poesia / Prosa na Veia;
Carlos Qualquer Coisa — Domador de Quimeras;
Bárbara (B.) — Delírios & Loucuras.


Boa sorte!


13/02
Tentemos outra vez...

Tendo o Domador de Quimeras escapado tangencialmente de um exílio forçado, indico o Jota, do blog Brinquedo Barato para compartilhar o cruel destino das minhas outras quatro vítimas.

5 de fev. de 2008

Inelutável


Pouco importa
que você não goste do que eu escrevo, isso não vai me fazer parar.

Então você, valente, amputa meu braço direito. Eu me rio disso e me torno canhoto!

Você me tira o braço esquerdo, achando que isso resolve o caso. Eu aprendo a escrever com os pés.

Aprendendo com a experiência, você remove minhas pernas, as duas de uma vez; tampouco adianta, eu passo a ditar o que quero ver escrito.

Mas se você quiser realmente me dar poder, corte minha língua. E eu vou gravar telepaticamente minhas palavras dentro do seu cérebro.

Você nunca vai escapar de mim...

2 de fev. de 2008

De volta, afinal!


(Então, podemos recomeçar...?)


Diletos leitores! É um prazer voltar à sua companhia depois de uma ausência de mais ou menos um ano, se não me falha a memória! Não esperava ser silenciado por tanto tempo, mas tive uma surpresa ao chegar ao fim-de-mundo: um defeito na linha telefônica, que a operadora levou três semanas para consertar...

Como têm passado? Faço votos que 2008 traga a cada um de vocês aquilo que desejarem, seja realização profissional, independência econômica, crescimento pessoal, satisfação afetiva, prazer (ou dor, de acordo com sua índole)... o que quiserem, enfim: os portões do Tempo estão abertos e o espaço entre as estrelas arcaicas é o limite.

Senti muita falta da blogosfera, lá onde estive; tentei manter o contato, mas minhas circunstâncias, que sempre gostaram de brincar comigo, me impediram de deixar pelo menos uma mensagem a cada um de vocês. Àqueles que eu não consegui alcançar, peço sinceras desculpas. E espero poder receber notícias de todos em breve.

Ainda estou sob a influência da síndrome de fim de ano, um mal levemente aparentado com a licantropia*; seus sintomas são conhecidos: depressão generalizada, euforia impertinente, esperança galopante (as promessas!) e no meu caso, absoluta falta de inspiração e total falta de autoconfiança. Devo dizer em minha defesa, porém, que não faço tais promessas; fiel ao meu caráter irrealista, prefiro passar o ano fantasiando ser outra pessoa (ainda que não saiba, até o presente momento, que pessoa seria essa). Veremos o que o novo ano trará...

O caderno de notas está aberto de novo; é sempre um prazer tê-los revirando-o!



*Psiquiatria: Doença mental em que o enfermo se julga transformado em lobo.
Fonte: Dicionário Aurélio Séc. XXI.