31 de out. de 2007

"Travessuras ou Gostosuras" (em tempo!)

Como um general romano, Arthurius Maximus comanda uma legião de quatro blogs, dos quais eu me tornei leitor assíduo do Contos Ancestrais (desculpe por essa, espero corrigir a falha o quanto antes), dedicado aos seus ótimos textos de terror e mistério.
Em comemoração ao seu primeiro aniversário, ele organizou um concurso em que vários leitores colaboraram com contos ou postagens sobre o blog e, para minha honra e felicidade, o meu conto foi considerado vencedor; foi minha primeira colaboração em outro blog, além de minha primeira participação com um texto em um concurso, ou seja, uma tripla alegria!

O prêmio é um mp3 player, que me põe um pouco mais perto dessa modernidade que tanto me confunde (exagero: a verdade é que estou me divertindo como criança com brinquedo novo!).

Quero convidá-los a visitar os Contos Ancestrais, se já não o fazem, para conferirem os ótimos contos dos participantes do concurso, que mostram grande criatividade e talento. Além, é claro, os textos do autor neste e em seus outros blogs, a quem eu agradeço pela gentileza e desejo felicidades e sucesso crescente.

28 de out. de 2007

Aleluia


Quando o Paraíso ameaça nos devorar,

o Inferno nos redime.



Graças a J. Milton, E. A. Poe e Charles Baudelaire.

Buraco Negro

Mais de uma semana sem Internet (conexão discada gratuita em casa, a única confiável). Quase uma quinzena sem meus paraísos artificiais (o único momento em que confio em minha mente). Nem mesmo uma linha escrita nesse tempo todo...

Vácuo. Como o da mente de Zaratustra Jr., atualmente. Amnésia total. Gnoseológica.

Rogo por vossa paciência. Como Marcel Proust, estou em busca do tempo perdido...





Trilha sonora: "Careful with that axe, Eugene", Pink Floyd.

16 de out. de 2007

De muros e camisas-de-força

"Filosofar a golpes de machete pode ser muito perigoso!"

Assim pensava Zaratustra Jr. enquanto observava os loucos passearem no ensolarado pátio do hospício. Ele está aqui para solucionar o dilema que sua "missão", como ele a chamava, havia criado.

Em sua caminhada, havia observado as pessoas. Muitas delas lutavam pela vida, uns com maior dificuldade que outros, mas todos lutavam; ouvia suas queixas, testemunhava suas alegrias, tentava entender seus motivos. E percebia que além desses muitos, havia uns poucos que apenas gozavam a vida; estes poucos de modo algum lutavam, pois descobriram o modo de usufruir de benefícios que não estavam à disposição de todos. Faziam isso explorando as outras pessoas.

Zaratustra Jr. observou os muitos e os poucos. E os chamou de loucos.

As pessoas ouviram Zaratustra Jr. bradar contra a loucura do mundo. E ficaram perplexas: como alguém ainda podia ser ingênuo a ponto de sonhar que a realidade poderia ser modificada com meras palavras? Acaso seria aquela figura esquisita e barulhenta mais capaz de organizar a vida e a sociedade do que todos eles juntos? Acaso teria todas as respostas, conheceria mesmo todas as dúvidas que a própria humanidade ainda estava catalogando? Acaso se achava um super-homem?

As pessoas ouviam suas palavras arrevesadas. E o chamaram de louco.

E agora, quem é o louco, afinal?

O que é ser louco?

Aqui, pois, está Zaratustra Jr., apartado da grande sociedade humana, confinado entre os ditos alienados, tentando definir a sanidade pela loucura, sob o martelo dos deuses...

11 de out. de 2007

Nietzscheando

Ele foi visto pela primeira vez caminhando na estrada, seguindo a linha dos canaviais sob o sol escaldante. Vinha seguido por um grupo de cães vadios e um enxame de gafanhotos; não carregava um bastão de peregrino, nem uma trouxa na ponta de uma vara, nem mesmo um mísero mp3 player.

Zaratustra Jr. havia tomado uma cerveja a mais e ficara sem dinheiro para o ônibus. Oh, dura vida dos profetas...

Não encontrara ninguém a pé no caminho a quem pudesse falar da sabedoria das idades e que lhe oferecesse um cigarro; os carros e caminhões que passavam por ele só tinham palavras rudes para a sua pessoa e a de sua mãe. Mas ele soube responder à altura as provocações do mundo, e felizmente ninguém se deu ao trabalho de voltar para tomar satisfações: ele tinha a língua afiada dos que viram a realidade por trás do véu e tinha o estômago embrulhado de acordo...
Chegado à pequena cidade, olhou ao redor e assim falou Zaratustra Jr.:

"- Mas que lugarzinho de merda! Bom, quem não tem cão..."

Procurou a companhia das mulheres e foi rejeitado com um misto de ridículo e pena. Não era a primeira vez.
Tentou então pregar aos homens, numa tentativa de afastá-los das trevas que os encobriam e cegavam; parou quando eles começavam a arregaçar as mangas e recolher pedras e paus nas ruas. Pensou mesmo ter visto um machete de cortar cana, mas não ficou para averiguar. Seu caminhar o levou a uma praça vazia, onde ficou vagabundeando, cercado por novos cães vadios, enfim livre dos gafanhotos; estes foram substituídos pelas moscas.

Ali ficou por três dias, em retiro. Não lhe deram um único cigarro, os miseráveis!

Vendo que nada adiantava, resolveu cair na real e ir para casa. Ali fumou, foi ao banheiro e reconheceu a enormidade da tarefa que se lhe impunha: a divulgação da visão que lhe fora revelada e a exposição das falácias da vida pós-moderna, custasse o que custasse.

Suas a partir de então lendárias dores de cabeça começavam naquele momento...

7 de out. de 2007

O mito da caverna revisitado

Teias de aranhas pelos cantos, rolos de poeira ao pé dos poucos móveis. A porta trancada e a janela sempre fechada, numa tentativa frustrada de manter afastados o mundo no geral, e a vizinhança, no particular. No castelo desta casa, esse cômodo cumpre uma dupla e contraditória função: são as ameias de onde se vigia o exterior e de onde partem os ataques retaliatórios, dos quais este mundo certamente não chega a tomar conhecimento; e é a masmorra onde se trava uma luta diária com a loucura, enquanto se lançam olhares invejosos para a vida que se agita lá fora.

Este lugar é o meu quarto, ao mesmo tempo uma toca e uma jaula. Eu "vivo" aqui.

Como uma árvore que cresce num local inadequado, fixo minhas raízes neste espaço insuficiente com a tenacidade das coisas que não querem abandonar a existência por difícil que ela seja (uma vez perturbado o repouso do não-ser, uma vida vai cobrar uma força gigantesca para retornar ao estado inercial anterior).
Exagero: lendo isso, passo a impressão que eu jamais saio daqui, o que não corresponde aos fatos: eu me exponho, com certa freqüência, aos níveis sempre crescentes de raios ultravioleta do sol e à convivência cada vez mais decepcionante das pessoas.
Além do mais, meus venenos prediletos, o álcool e o tabaco, e minha mais antiga paixão, os livros, insistem em não vir de moto próprio às minhas mãos...

Então, eu tenho de sair.

Ainda que esta venha sendo a rotina de uma vida, até hoje não saberia dizer se me custa maior esforço sair deste cubículo ou voltar a ele: quando saio, é a segurança da fortaleza que abandono; quando volto, são as portas do cárcere que me recebem. Na noite do meu céu resplandece a Lua Negra: quero o que não tenho, tenho o que não quero, não faço o que gosto e não gosto do que faço.

Não, sim.
Sim, não.
Não, sim.
Sim. Não.

Não sei. Apenas, talvez, expanda minha confusão para essas paredes, ancore minha mente no espaço confinado por elas; sem limites a consciência não pode existir...
Eu vivi quase toda minha vida num espaço assim, em outro lugar, outra casa; aquelas paredes chegaram a fazer parte de mim, como o chão faz parte das raízes que sustenta, como foram cenário de paralisia e decadência. Já agora vão anos foram postas abaixo, não existem mais, outras foram erguidas em seu lugar. Parte de mim, para bem, para mal, deixou de existir com elas. Uma árvore transplantada. Raízes cortadas, regenerando-se lentamente. Esperando a lâmina do machado, entre quatro novas paredes.
Uma nova fortaleza. Uma nova masmorra.

Que venha...

4 de out. de 2007

Contos da Chuva de Primavera



" quantos dias a chuva de primavera chegou? Que agradável e calmo está! Peguei meu pincel favorito e tinta, mas ainda que eu ponderasse árdua e longamente, não pude pensar em nada para escrever. Simplesmente imitar os antigos romances é tarefa para o iniciante. Minhas próprias circunstâncias, no momento, pouco diferem das de um humilde guarda-matas: como poderia minha vida inspirar um conto? Relatos do passado - bem como do presente - seduziram a muitos; de fato, eu mesmo desavisado que tais histórias são mentiras, cheguei a desencaminhar outros por tê-las repetido. Mas que importa? Tais relatos continuarão a ser contados, e sempre haverá quem os honre como verdadeira História. Consciente disso, eu continuo a escrever meus contos, assim como a chuva de primavera continua a cair."

Introdução do livro "Harusame Monogatari" (Tales of the Spring Rain), de Ueda Akinari; tradução para o inglês de Barry Jackman.