28 de jul. de 2009

Sombras não têm Sexo

“— Você me deseja?”, pergunta Felícia.
“— E porque deveria?”
“— Bem, está sempre por perto...”
“— Sua responsabilidade: sem você, eu não existira...
Ela se aproxima, sua companhia se afasta.
... e existindo, não sou nada.”

Seus olhos fitam a escuridão, em silêncio.

26 de jul. de 2009

7 dias na Vida

O homem que era segunda-feira acordou levemente entediado. Foi para o trabalho sem muito entusiasmo e voltou para casa decididamente entediado.

O homem que era terça-feira estava preocupado com as contas atrasadas; isso não ajudou muito — as contas continaram por ser pagas. Na televisão não encontrou nada de interessante, então foi dormir cedo.

O homem que era quarta-feira se encontrou com a moça com quem vinha saindo; jantaram, foram a um motel, transaram duas vezes. Ao deixá-la em casa ele a beijou e combinou um novo encontro na próxima semana (ela não teria o final de semana livre).

O homem que era quinta-feira se perguntou durante todo o dia se o tempo não estaria passando mais rápido ou se era apenas ele envelhecendo. Não conseguiu chegar a conclusão nenhuma.

O homem que era sexta-feira saiu com alguns colegas de trabalho para um happy hour, ocasião em que ele descobriu, desconcertado, que happy hours duravam consideravelmente mais que uma hora e nenhum momento deles era realmente feliz.

O homem que era sábado lavou o carro.

O homem que era domingo não saiu da cama e morreu ao por do Sol.

25 de jul. de 2009

A Tribo

Os mentirosos contam histórias entre eles. Eles não se importam que sejam mentiras; eles não se importam com nada. Exceto que lhes interrompam as histórias.

Há paus, pedras e uma fogueira para os infelizes que tentam.

21 de jul. de 2009

Soneto do Poeta Torpe


O raciocínio, por melhor que seja formulado
Esbarra sempre na cruel falta de talento:
E ainda que despenda todo o seu alento,
Jamais viu o sublime objetivo alcançado.

Se envergonha do senso estético desatento;
Solitária e triste sina de amador frustrado:
Insignificância há de ser o seu legado,
Enfado — a suma de seu destempero.

Métricas, rimas, sílabas, linhas,
Fragmentos vãos do sonho que lhe coube;
Nunca o sumo doce das vinhas

Da divina Musa que nunca o ouve.
Não a alma ardente que julgou que tinha:
Apenas isso — só um poeta torpe.

20 de jul. de 2009

Comemoremos!

O Dia do Amigo
Dos amigos do poder, amigos da corrupção, amigos do ódio, amigos do medo

A conquista do espaço sideral e invasão da Lua
Frustrada fuga da cena dos crimes contra a Terra

A justiça social de nossos tempos
As 40.000 crianças que morrem de fome todos os dias

A violência desenfreada
Física, moral, psicológica, urbana, rural, doméstica, laboral...

A morte da cultura humana
No funeral diário que é a indústria do entretenimento de massas

A fé
Nos deuses mortos-vivos, todos eles

A era da informação
A nova Era das Trevas




"Raise your glasses to the good and the evil
Let's drink to the salt of the earth."


18 de jul. de 2009

Hoje é Feriado!


É o Dia da Maldade.


Agradecimentos especiais (e um pedido de desculpas) a Raul Seixas.

15 de jul. de 2009

Universo Feito a Mão

Espelhos

Agora você vê — agora não vê mais,
Com olhos de enxergar e a mente a entender.
Moldar o real para poder nele viver,
E perder o sentido da vida que há por trás.
Não há razão para ter medo e mesmo assim
Tememos o começo e odiamos o fim;
Oh, o que será de nós, o que será de mim?
Obedecer ao “não” e combater o “sim”.
Agora você vê — agora não vê mais,
Com olhos de enxergar e a mente a entender.
Além de tudo que ainda há por conceber,
Inalcançável para sempre o prêmio jaz.
Toda nossa indústria e toda nossa astúcia
Não mudam nossa quimera em coisa lúcida;
Buscando a plenitude em sua forma justa
No vidro frio do enigma a marcha acaba, brusca.
Nem esperança nem desespero temos,
Seguimos vivos apenas porque vivemos.
Com olhos de enxergar e a mente a entender,
Agora você vê — agora não vê mais.




Fumaça

Teias vivas, vivas,
Nascem, sobem, rumorejam;
Fumaça multicor.

Responsabilidades

Na introdução do livro “Smoke and Mirrors”, Neil Gaiman escreve:

“... e eu me pergunto de onde vêm as histórias.

É o tipo de pergunta que você se faz quando sua profissão é inventar coisas. Eu ainda não estou convencido de que essa seja uma atividade adequada para um adulto, mas agora é tarde demais: pelo jeito tenho uma carreira de que gosto e que não envolve acordar cedo de manhã. (Quando eu era criança, adultos me diziam para não inventar coisas, me prevenindo do que aconteceria se eu o fizesse. Até onde posso perceber, inventar coisas parece envolver muitas viagens ao estrangeiro e não ter de levantar cedo de manhã.)”

Minha situação é um pouco mais complicada, já que não escrevo profissionalmente e não sei até hoje que atividade seria adequada para um adulto; assim, eu continuo simplesmente não fazendo nada. Ou melhor, escrevendo de vez em quando, só para ver se ainda sou capaz.
Eu preferia não ter me tornado adulto mas, como bem disse Humpty Dumpty para Alice atrás do espelho (e eu suponho que seja do conhecimento geral), são necessárias duas pessoas para se parar de envelhecer e eu nunca encontrei ninguém disposto a continuar eternamente criança comigo. Talvez haja algum terrível preço a se pagar pela infância eterna, como nos contos de terror ou de fadas; eu não sei e duvido que mais alguém saiba.

Honestamente, eu não sei porque estou começando de novo, exceto talvez por ter sido a única coisa capaz de tornar minha vida tolerável por dois anos; às vezes me pergunto como é que vivia antes. Felizmente não me lembro dessa parte da história.

Eu não sei de onde vêm as histórias nem os pensamentos nem os sentimentos. Sei que, vira e mexe, eles aparecem como os beija-flores em frente a minha janela. Espero continuar sendo rápido o bastante para perceber quando eles estiverem lá, assim vocês saberão também.

E o que é melhor:
pra isso não preciso acordar cedo!

12 de jul. de 2009

Sonhado apocalipse meu de cada dia

O fim não chegou e com ele, nenhum recomeço. Planos nunca dão certo comigo, mesmo...

Não que seja uma surpresa total; há muito que ensaio a transformação que anseio e temo, há muito que sei o que está errado mas não sei como consertar, eis tudo: sou um viciado que nunca segue o tratamento auto-imposto...
Dito isso, só me resta seguir cabeceando como de costume.

Então não foi o fim, o apocalipse não veio. Sinto muito, vocês estão sem sorte!