Agnosticismo, cristianismo e Nietzsche
O Cristianismo repousa em dogmas e crenças que permitem à consciência fraca e escrava escapar à vida, à dor e à luta. Impõe a resignação e a renúncia como virtudes. São os escravos e vencidos da vida que inventaram o além para compensar a miséria. Falsos valores para se consolar da impossibilidade de participação nos valores dos senhores e dos fortes. Forjaram o mito da salvação da alma porque não possuíam o corpo; criaram a ficção do pecado porque não podiam participar das alegrias terrestres e da plena satisfação dos instintos da vida. Vontade de aniquilamento, hostilidade à vida, recusa em se admitir as condições fundamentais da própria vida: eis o que é o Cristianismo...
Esta é, sem dúvida, uma análise brilhantemente penetrante da psicologia da religião cristã. Mas deve ser reconhecido que ela se aplica ao cristianismo estabelecido: em sua origem, essa religião foi criada, se impôs e foi imposta a ferro e fogo a um meio cultural que entendia os poderes superiores como múltiplos. A visão da época era a de um culto à vida natural, material e orgânica, como vista nas matas, nas águas, nos ares; estes eram os reinos dos deuses, cada qual presidindo um aspecto particular da existência, num processo cíclico, sem fim e não sujeito a modificações em sua estrutura básica. A luta pela sobrevivência se confundia com a luta contra as forças da natureza, e o engenho humano logrou desenvolver meios de atrair e até mesmo constranger tais poderes à benevolência ou de evitar seu desagrado e violência.
A visão cristã é radicalmente diferente. Postula a queda de um estado idílico ideal, para o qual a humanidade foi destinada originalmente por um criador único, onipotente, que mantém com esta uma relação de senhor para com seus escravos, concedendo-lhes por via da graça o que eles não podem fazer por si próprios. Ainda que, com o passar do tempo, a maioria das pessoas acabasse aceitando tais postulados, o faziam em diversos graus de má vontade, pois ninguém pode acreditar que se aceite uma vida eivada de culpa e pesar de bom grado. O ressentimento deve ser visto como subproduto da relação servil; o desgosto do escravo por sua condição de inferioridade não é invenção cristã, assim como não o é a escravidão em si.
A reação aos valores cristãos se deu inicialmente pela inversão desses valores no culto satânico. Enquanto a visão aprovada fazia desta vida fonte de miséria e sofrimento para uma maioria desvalida e tolerava opulência de uns poucos, entre eles o próprio alto clero, o satanismo se ergueu da nostalgia da antiga religião natural, e a ela adicionou a revolta contra a miséria e o ódio por todos os seus emblemas. O anticristianismo, assim considerado, não passa de um cristianismo ao avesso.
Já a postura agnóstica tem outra fonte. Origina-se da visão científica do mundo, que ganhou relevo justamente com o declínio da crença religiosa como imagem e modelo do mundo, durante o Iluminismo. A recusa do argumento de autoridade da revelação religiosa marcou uma busca pelo conhecimento contra a crença; levou a dúvida quanto à própria existência dos poderes divinos. Mas agnosticismo não deve ser confundido com ateísmo: a agnose não tem juízo formado quanto à realidade transcendente; ela busca formar uma imagem do mundo dentro dos limites do sensível e do conhecível. Estando o transcendental além de sua capacidade atual de investigação, ela suspende o julgamento, no aguardo de novos e melhores métodos de pesquisa, bem como conceitos mais abrangentes e eficazes a respeito do universo ao seu alcance.
Escrito em 01/05/07
[editado 07/05/07]
Mais um erro crasso! Além da maneira brusca e inexplicada com que este ensaio supostamente filosófico veio parar em meio desses devaneios (não tinha onde colocá-lo), não esclareci que o tema e a citação de Friedrich Wilhelm Nietzsche vieram de um tópico de discussão na comundade do Orkut Agnóstico Vagabundo sobre o blog do mesmo nome, que é altamente recomendável, diga-se. Desculpem-me mais essa falha (em especial o Lanark).
Parece que a senilidade precoce vem se juntar à amnésia. Tempos difíceis à vista...
2 contrapontos:
muito interesante o texto, quem é o autor do primeiro paragrafo?
nietzsche é o cara, muito bom.
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