Nasce um profeta!
Zaratustra Jr. tinha por ocupação recolher o lixo das ruas daquele lugarejo; não era missão das mais fáceis, pois ele diversas vezes pensava se deveria recolher, juntamente com os restos nos caminhos, as pessoas que os jogavam.
Certo dia, numa rua do suposto centro da cidade encontrou, entre os costumeiros dejetos, um macaco morto.
— Que diabo isso está fazendo aqui?!
Ao tentar jogá-lo na carroça, outra surpresa:
— Que está fazendo? Não pode pôr isso aqui não!
— E faço o que então, deixo na rua?
— Claro que não, o lugar desse bicho não é na sarjeta...
— Então...
— ...mas na carroça ele não vai.
— E o que eu faço com ele?
— Sei lá, leva pra carrocinha...
E lá se foi Zaratustra Jr. Mas no referido local se recusaram a dar guarida ao cadáver: "Aqui nós cuidamos só de animais domésticos, e macaco é bicho do mato", disseram. "Tenta no IBAMA..."
Convém dizer que a pequena localidade era afastada da civilização, o que talvez fosse uma vantagem, no geral; mas nesse caso em particular tal fato chegava a ser um transtorno: nada de IBAMA, nada de crematório, nada de nada. Zaratustra Jr. percorreu todo o lugar procurando se livrar do defunto, sem resultado; houve mesmo quem pensasse as coisas mais absurdas a seu respeito:
— Você matou seu irmão e agora quer que eu dê fim no corpo?
— Irmão? Irmão é a puta que o pariu!
Ao cair da tarde, percebeu que a sociedade e suas instituições não resolveriam aquele problema, que passou a ser dele; então, se encaminhou para um matagal na periferia, arrastando consigo o símio morto. Chegando embaixo de uma árvore, largou a carga e
pôs-se a meditar:
— Mas será possível? O que vou fazer com essa porcaria agora? Preciso de uma luz, um sinal, sei lá...
Foi então que algo o atingiu. Na cabeça.
Zaratustra Jr. olhou para cima e viu um urubu pousado bem acima dele; aquilo o fez ficar fora de si:
— Ah, maldito miserável, é assim, é? Nesse jogo jogam dois!
Assim dizendo, agarrou o macaco pelo rabo, girou com toda a força e atirou-o no fatídico pássaro da morte, acertando-o em cheio e derrubando-o de seu poleiro. Ao ver os dois animais jazendo lado a lado, gritou em triunfo:
— Pra mim chega! Fiquem aí mesmo vocês dois e que se dane a saúde pública! Que cada um cuide de seu próprio lixo!
Tomada a decisão, desafiado o Destino, assim saiu Zaratustra Jr. pelo mundo, com apenas um pensamento fixo:
— Como é que eu vou limpar essa merda?! Saco!